sábado, dezembro 31, 2005

sexta-feira, dezembro 30, 2005

Samuel

Luiza Caetano
“Concílio das Gaivotas”

Samuel olhava o mar e agitava-se do vento que o abanava e desequilibrava. E ria-se no seu grasnar desengonçado. Era bom o vento na sua cara. Trazia-lhe o cheiro que ele adorava.

Samuel levantou um pé queimado pelo Sol e coçou-o. Sentiu um alívio que o fez espreguiçar-se de prazer.

Samuel olhou os companheiros que se abriam ao encontro da suavidade da tarde e sorriu com alegria pela fraternidade que descobriam entre si. Era bela esta tarde de Inverno, tão seca e solarenga.

E neste devaneio, Samuel abriu as asas e voou ao encontro das outras gaivotas que brincavam ruidosamente.

quinta-feira, dezembro 29, 2005

2005: Um olhar sobre o caminho


2005 está a chegar ao fim. Fim de ano é sempre fim de ano. Com festa e tudo. Mas é também tempo para olhar para trás e procurar ver o caminho percorrido. Não para ficar retido no que passou. Mas para podermos olhar o que aí vem com o sabor do tempo. Que é sempre olhar de esperança. Mesmo que de esperança apenas se vislumbre o sonho.

Por agora, apenas o lembrar do que fui lendo ao longo deste ano. Da memória, entre outros, retenho alguns livros que “puxaram” por mim e, de uma maneira ou doutra, me tocaram bem fundo. E que recomendo vivamente. (A ordem é naturalmente arbitrária)

Uma Deusa na Bruma
João Aguiar

Ed. ASA, 3ª Edição, Junho 2003
Contrariamente ao que muitos “homens” poderão continuar a dizer, o “homo misticus” também se afirma no feminino. Se calhar há mais tempo, até, do que no masculino.
Esta obra poderá até nem ser a melhor do autor, mas nela se revela, seguramente, João Aguiar no seu melhor.

CHE – Ernesto Guevara, Uma lenda do século
Pierre Kalfon
Terramar, Março de 1998, Tradução: Manuela Torres
Ernesto Guevara de la Serna, “um asmático apressado, grande contestatário, foi também um semeador de sonhos.
Goste-se ou não dele, concorde-se ou não com as suas ideias, com a sua vida, com os seus actos, com as suas palavras, o Che foi, na verdade, um vulto destacado no seu tempo. Ficou, pois, na História. Na História de nós todos.

Elogio do Imbecil
Pino Aprile
Dom Quixote, 2003
“Os inteligentes construíram o mundo, os estúpidos vivem à grande”. Ou melhor: “os inteligentes construíram o mundo, mas quem desfruta dele e triunfa são os imbecis”.

O Maçon de Viena
José Braga Gonçalves

Ed. Primebooks
O Príncipe Rosa-Cruz
José Braga Gonçalves
Ed. Primebooks, 2005
Uma maneira diferente de olhar a figura de Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-1782), 1º Conde de Oeiras e 1º Marquês de Pombal. E através dele, o saber contar outras histórias.
O acerto de contas consigo próprio. Mas também com os outros, estou certo.

A Comenda Secreta
Maria João Martins Pardal e Ezequiel Passos Marinho

Ed. Esquilo, 2ª Edição, Outubro 2005
Um outro olhar sobre a fundação de Portugal. D. Afonso Henriques e o Mestre Gualdim Pais: uma mesma “Comenda”.
Como me disse o meu amigo Ezequiel, “a leitura deste livro não é recomendada a fundamentalistas”.

Havemos de voltar com outras memórias.

quarta-feira, dezembro 28, 2005

Duas Mãos

Duas mãos pousaram, suavemente,
Nos teus ombros, ainda frágeis,
De criança interrogante.

Duas mãos se estenderam, paternais,
Sobre a tua cabeça, irrequieta,
De criança, ainda imóvel.

Duas mãos se abriram, fraternais,
Perante o teu olhar, puro e alegre,
De criança simples e verdadeira.

Duas mãos te empurraram com ternura,
Levando-te pelo caminho seguro
Dos que não temem, dos que vivem.

(Lisboa, 1981)

sexta-feira, dezembro 23, 2005

Bom e Feliz Natal

Retábulo da Capela-mor da Sé de Viseu (Painel “Natividade”)
Tudo indica que os painéis tenham sido feitos por uma equipa liderada pelo pintor flamengo Francisco Henriques, entre os anos de 1501 e 1506. A essa equipa de pintores e entalhadores flamengos juntou-se o ainda jovem Vasco Fernandes, mais tarde nomeado com o título de Grão Vasco, sendo esta a primeira obra em que trabalhou ou, pelo menos, a primeira que conhecemos.

As trombetas do Natal

Um dia destes, creio que na SIC, estava a dar um programa onde, salvo erro, uma apresentadora andava a distribuir prendas (brinquedos), conseguidos em peditório público, em vários locais, a crianças em diversos bairros degradados do país e a várias instituições de carácter social. E com grande aparato referiu-se que receberam prendas, segundo creio, cerca de cinco mil e tal crianças.

Fiquei contente. Agradou-me ver a solidariedade demonstrada. Sinceramente.

Mas, se calhar, talvez ficasse muito mais “tocado” se, por exemplo, “não soubesse”, mas fosse verdade, que a SIC, ou qualquer outra instituição ou entidade de qualquer tipo, tinha ido “em silêncio” oferecer prendas a algumas crianças desfavorecidas, mesmo se o número fosse mais diminuto.

quinta-feira, dezembro 22, 2005

Há sempre uma palavra

Há sempre uma palavra
Que se esconde
Daqueles que desconhecem o mar.

E o mar, como a chuva,
Vem de mansinho
E inunda os nossos corpos sedentos.

Há sempre uma palavra
Que se descobre
No sonho que arriscamos.

E o sonho, como o tempo,
Vem encontrar
O espaço que deixamos livre.

Há sempre uma palavra
Que inunda o sonho
E permanece livre como o mar.

quarta-feira, dezembro 21, 2005

Obrigatório ler (e já agora, comprar a revista)

Ao ler a revista Cais (nº 103, Novembro 2005), chamou-me a atenção o artigo “Apartheid Social”, de Henrique Pinto.

De facto, o combate à pobreza e à exclusão social é tarefa de todos. Quer queiramos, quer não. Porque só assim a solidariedade se tornará eficaz. É que se não for assim, apenas nos restará a hipocrisia (tantas vezes latente) da escamoteação da realidade.

É que às vezes parece mais que acalmamos a nossa consciência com o não ver o que existe (porque até o conseguimos esconder…).

Para que conste, aqui fica um excerto:

“(…) Temos vindo a escrever que a erradicação da pobreza é tarefa de todos, e que a ética sobre a qual assenta esta missão nada tem a ver com boa ou má vontade dos políticos, com excedentes financeiros, ou a moda a que se podem render, numa determinada estação, indivíduos, grupos ou empresas. A responsabilidade social ou o cuidar de si e dos outros, a que cada um é chamado, por razões de contingência e finitude humana, é uma convocação e um desafio diário, intrínseco à vida, e que nunca poderá vez alguma existir condicionado por qualquer tipo de circunstâncias ou desculpa esfarrapada. (…)”

E, já agora, não se esqueçam de “ver” quem vos aparece “na rua” com a revista na mão. Ela precisa de “mudar de mãos”.

terça-feira, dezembro 20, 2005

Pequenos gestos


Um dia destes, à noite, sentado no meu velho sofá preferido, prestava-me para acabar a noite a ver um filme, para mim desconhecido, num dos canais da nossa televisão.

As primeiras imagens eram, salvo erro, sobre um super-herói, Turboman (ou qualquer coisa de muito parecido). E lá surgiu a ficha técnica, com os intérpretes à cabeça. Onde sobressaía um nome: Arnold Schwarzenegger.

Reacção óbvia: Zapping! E fui ver outra coisa. (Continuo a ser o dedo mais rápido lá da casa, no telecomando.)

Os motivos, bem, os motivos podem ser vistos, por exemplo,
aqui e aqui, entre outros.

Sei que esta minha atitude não mudou, não muda, nem vai mudar nada na nossa sociedade. As coisas vão continuar a ser como dantes. O ser humano é o ser humano, nada a dizer. Para além de que eu, sou apenas eu. Com toda a minha pequenez possível.

Mas, no meio de tudo isto, lá que me senti um pouquinho menos mau, lá isso é verdade. E quando chegou a hora, lá fui dormir. Um pouco mais desopilado, é verdade.

segunda-feira, dezembro 19, 2005

Instantes

Num instante se passa
Da noite para a alvorada
De um dia que se quer
Novo.

É o sonho
Que nos invade a razão
Demitindo-a.

De repente vivemos
Ainda.

De volta

E como, felizmente, não há mal que sempre dure, cá estou de novo.
Isto de sermos nascentes de "pedras" dentro de nós faz-nos descobrir o outro lado da dor. Faz-nos perceber que, afinal, a diferença entre o "bem-estar" e o "mal-estar" (enfim, entre a saúde e a doença) é tão-somente uma linha muito fina e muito ténue. É simplesmente um momento que de breve sabemos apenas que existe. Não que dura. Fugaz distância, a que se descobre entre o sentir bem e o não poder sequer sentir.
Mas já passou. Espero que por longo tempo. Espero que de longo não lhe conheça o ocaso.
Em tempo de Natal, o "alívio" que senti há dias, foi "prenda" bastante para mim. Já recebi, pois, a minha.
Já agora, aproveito para agradecer aos amigos que se lembraram de mim, nomeadamente a ACarlos, o e o Armando Ésse. O meu obrigado.

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Acontece

Acontece.
Caí de cama na Segunda-feira. Crises renais com pedras.
A cabeça tem andado à roda. Por isso o melhor é estar quieto.
Até breve, pois. Espero.

sábado, dezembro 10, 2005

Leituras interessantes


Estou de acordo com o que diz João Miguel Tavares, no
Diário de Notícias (09.12.05), sobre a tão badalada questão dos “crucifixos implacáveis”.

Quer-me cá parecer que os meus amigos e “irmãos” do laicismo (como por exemplo a “República e Laicidade”) têm feito mais pela minha (re)aproximação plena à Igreja, do que o próprio Papa, os Bispos e todos os sacerdotes da minha terra. Mesmo tendo em conta os excessos – quase anormalidades – de alguns membros do clero, como por exemplo o padre franciscano Nuno Serras Pereira (como deve estar a torcer-se, incrédulo e desalentado, lá onde estiver, o fundador da sua ordem, Francisco “o pobre de Deus”), que se meteu com indecorosa falta de “espírito cristão” com a Associação para o Planeamento da Família.

Embora já saiba que os meus amigos António e Rogério (o Zé até talvez não, mas apesar de tudo também) se vão rebolar na cadeira com esta minha “crise existencial”, tinha de desopilar o espírito. E uma provocaçãozinha não faz mal a ninguém.

sexta-feira, dezembro 09, 2005

O Jardim (XII)

Era uma vez um sonho.
Revalava-se cada dia
Como ânsia de descoberta.

Como todos os jardins
O meu corria bastas vezes
O caminho da apatia.
Fechava-se
E não era capaz
Da aventura
Do risco.

Por isso o sonho.
Por isso a incredulidade
A invadir a certeza.

E da incredulidade
Nasceu a intolerância.

Por isso a violência
O medo do futuro
A temeridade do devir.

E assim o sinédrio
A acusação
O julgamento.
E a morte
Foi a conclusão
Da lógica do quotidiano.

Hoje no meu jardim
Despontam sem receios
Martírios da nossa certeza.

quinta-feira, dezembro 08, 2005

PGR e Paulo Pedroso


Na segunda-feira passada, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que manteve a decisão de não levar Pedroso a julgamento, transitou em julgado, depois de terem cessado todos os prazos legais para recurso, o que encerrou o processo relativamente a Paulo Pedroso. Está portanto esta questão resolvida. É, pois, agora momento de olhar para tudo isso com os olhos do tempo e da memória.

E o que faz, então, Souto Moura? Como refere a Lusa (07.12.05), o Procurador Geral da República fala em resistências à investigação e pede provas sobre "cabala". E mais: "Quem tiver elementos que possam minimamente sustentar uma cabala que mos tragam", afirmou o PGR, questionando: "se continuam a afirmar a inocência e a dizer que isto é tudo uma construção e uma cabala porque é que em três anos nunca me trouxeram elementos por onde eu pudesse puxar para confirmar essa tese?"

Quer dizer: na douta opinião de Souto Moura, a presunção da inocência já não existe na nossa sociedade? Cada vez que fala, o PGR…

Sobre este PGR nada mais há a dizer. Ele próprio se tem encarregado de confirmar as razões porque o PR e o PM já deveriam ter pensado noutro para ocupar essa função.

Pense-se o que se pensar de Paulo Pedroso, concorde-se ou não com ele, goste-se ou não, venha a acontecer no futuro o que vier a acontecer, hoje, a Justiça (sim, a Justiça), a Verdade (sim, a Verdade), pelo menos, obrigam-nos a olhar para ele, olhos nos olhos, e ouvir e respeitar a sua palavra. Por mim, é o que faço aqui e agora, com um excerto do texto de Paulo Pedroso, no seu blogue Canhoto:

Pelo direito ao bom-nome, pela verdade e por justiça
(…) Este processo permitiu-me perceber que, em Portugal, hoje, não basta ser inocente para ser tratado como tal.
Algures, alguém, um dia, desencadeou as operações que culminaram na brutal difamação que sofri. Estou certo que também um dia, alguém, algures descobrirá o que aconteceu e como.
Sei, no entanto, que quem conduziu o inquérito judicial a meu respeito, agiu sem presumir sequer a possibilidade da minha inocência.
Pelo contrário, fui humilhado, ofendido, moralmente violentado. Fui alvo de uma perseguição que passou por uma prisão já declarada ilegal e uma acusação que agora foi judicialmente afirmado que nunca deveria ter existido.
O meu direito ao bom-nome foi repetidamente violado. Os elementos de prova que contrariavam a minha pretensa incriminação foram ignorados, desvalorizados e até retorcidos, em vãs tentativas deles extrair o contrário do que demonstravam.
Toda a minha vida seria muito diferente se essa acusação ignóbil não tivesse sido proferida. (…)”

quarta-feira, dezembro 07, 2005

Coisas da Bola


Numa sondagem do Expresso, de 3.12.05, refere-se que 68,4% dos inquiridos “consideram inevitável a introdução de «chips» electrónicos nas bolas e nas balizas de futebol”, contra 12,2% que consideram que “não, que deve continuar-se a confiar na visão dos árbitros assistentes no julgamento de lances duvidosos”.

Eh lá! Vamos lá a ver se a gente se entende. Para quê gastar assim o nosso querido dinheirinho, para depois não termos ninguém a quem deitar as culpas pelas azelhices, pelos azares e pelos disparates dos nossos clubes do coração?

Como é que é? E depois a quem é que vamos continuar a chamar nomes? Como, por exemplo: “Besta negra”; “Filho de qualquer coisa”; “Familiar disto e daquilo”; Animal da classe bovina”; “Canídeo com asma e com sarna”; “Deficiente de várias coisas, nomeadamente da visão”. E muito mais.

Desde já, aqui fica o meu direito à indignação. O meu direito ao escape semanal. Deixemo-nos de coisas: se calhar é melhor começarmos a chamar aqueles epítetos às nossas famílias, aos nossos amigos, aos nossos colegas de trabalho?...

terça-feira, dezembro 06, 2005

Um banco muito especial (*)


Nos tempos que correm, onde o que mais impera é o vale tudo, o que mais se torna notado é a pura e dura competição, selvagem e sem escrúpulos, onde a maior parte das vezes é o Ter que se sobrepõe ao Ser, onde o que sobressai é a imagem que se quer dar e não a realidade das coisas, é importante fazer eco daquilo que verdadeiramente faz a história mover-se.

Por isso, não resisto a deixar aqui o que o Fernando Madrinha escreveu no Expresso, na sua coluna semanal “Preto no Branco”:

“(…) Veja-se o caso do Banco Alimentar contra a Fome. Em si mesmo, é uma máquina exemplar de organização e eficiência, comandada por Isabel Jonet e movida, no seu quotidiano, apenas por voluntários, muitos deles a tempo inteiro. Mas é quando sai para a rua que mais facilmente se pode avaliar a sua importância crescente. Duas vezes por ano – na Primavera e no Outono – estimula e mobiliza a boa-vontade de milhares de pessoas, de centenas de empresas e entidades dos mais diversos sectores, em operações de recolha de alimentos para serem distribuídos pelas instituições de solidariedade que apoiam directamente os mais necessitados. No último fim-de-semana, juntou mais de mil toneladas de alimentos, o que corresponde a um aumento de 18,5% em relação à campanha de Dezembro do ano passado. (…)

Num mundo que nos parece cada vez mais desumanizado e numa sociedade que, por vezes, nos dá a sensação de estar em vias de se desagregar, com a lógica implacável do salve-se quem puder a impor-se como cultura dominante e irreversível, a disponibilidade destas pessoas – e a de milhares de outros que trabalham regularmente no apoio a múltiplas instituições de solidariedade que actuam em todos os sectores e um pouco por todo o território – é um capital social precioso para qualquer país. Assim haja quem saiba mobilizá-lo e pô-lo a render a favor dos que mais precisam, isto é, em benefício de todos.”

(*) Sub-título da crónica, no semanário

segunda-feira, dezembro 05, 2005

Ermera

Ermera foi o desterro
Desejado.
Há sempre a fuga
Ao bulício da cidade.
Ermera era um monte.
Isolado.
No seu ventre
Consumi o já consumado
E ardi em fogos
Inextinguíveis.
Ermera foi o navegar
Mares ainda inexplorados
E descobrir fontes
Onde a água corre
E não se esgota.

(Teorema, Dezembro 2003)

domingo, dezembro 04, 2005

Vale a pena ler

“(...) Hoje, contudo, depois de dar notícias importantes sobre guerras, massacres, ataques terroristas e quejandos e depois de algumas indiscrições prudentes sobre assuntos políticos correntes - mas sem assustar demasiado os espectadores -, os nossos programas noticiosos da televisão lançam-se em séries de matri-fratri-uxori-patri-infanticídios, assaltos, roubos à mão armada, tiroteios e - para que os espectadores não falhem nada - todos os dias parece que os céus se abriram sobre a nossa região e chove como nunca choveu antes, de tal forma que em comparação o dilúvio bíblico foi quase tão dramático como um cano de água roto.

E é aqui que achamos que há qualquer coisa por detrás disto, ou mesmo no centro disto. Dado que os directores do Canal Niagara não se querem comprometer com histórias económica e politicamente arriscadas, seguiram o caminho do Crime de Verdade. Uma boa sequência de cabeças decapitadas mantém o povo entretido e sem ideias perigosas na cabeça.”

Umberto Eco
Diário de Notícias, “Dêem-nos o crime diário”, 3 de Dezembro de 2005
(Exclusivo DN/The New York Times Syndicate)

sábado, dezembro 03, 2005

Pena de Morte


Foi ontem notícia (TSF) terem os Estados Unidos atingido a barreira dos mil executados desde o restabelecimento da pena de morte em 1976, com a morte de Kenneth Boyd condenado por duplo homicídio, na Carolina do Norte.

A propósito (ou, se calhar, sem propósito), George W. Bush resolveu vir a público «apoiar firmemente» a pena de morte. Estará no seu direito. Infelizmente e sem razão, creio eu.

Cá por mim, e conforme dizia, também ontem, em comentário que coloquei numa entrada do A Fábrica (que recomendo vivamente), sobre a Morte, a minha atitude é radicalmente contra a sua utilização como arma para atingir um qualquer objectivo. É uma questão de convicção ética e moral.

Honestamente, do que me conheço, não sei o que faria em determinadas situações. Não sei como reagiria em caso de atentados à minha integridade física, ou à dos meus. Não sei como me comportaria em situações de defesa da minha própria vida ou da dos que me são queridos (ou até, se calhar, em defesa da vida de qualquer pessoa, por uma questão de solidariedade humana). Mas isso não significa que me demita das minhas convicções.

É, afinal, a diferença entre atitude e comportamento. E, para que conste, sejamos claros, não há aqui nenhuma contradição. Há que assumi-lo sem tibiezas.

Mas, apesar de tudo, muito me admira (se calhar até não...) que os que andam, por lá e também por cá, permanentemente a falar em defesa da vida, estejam tão calados sobre isto.

sexta-feira, dezembro 02, 2005

Da minha boca um grito


Da minha boca um grito
Um espasmo
Um eco
De impotência.
Das minhas mãos um gesto
Um acenar
Uma imagem
De sofreguidão.
Da minha cabeça um sonho
Uma aguarela
Uma miragem
De viver.

Do teu corpo uma sensação
Um êxtase
Um frémito
De um momento infinito.

quinta-feira, dezembro 01, 2005

1º Dezembro

"Restauração de Portugal e Morte de Miguel Vasconcelos"
Tela de Antonio Fernandez
Foto: Centro Português

As janelas trazem-nos o que não está aqui
As janelas trazem-nos a luz que nasce lá ao fundo
As janelas trazem-nos a noite que cai, sem dela sabermos, às vezes
As janelas trazem-nos quem se deseja e, talvez, quem não se deseja
As janelas são muitas vezes os nossos olhos e os nossos ouvidos

As janelas são também, às vezes, as portas de saída para quem não percebe nem quer perceber que está a mais